DA REDAÇÃO – Mais de 600 profissionais de enfermagem em todo o mundo morreram vítimas da Covid-19 e outros 230 mil contraíram o vírus, de acordo com o International Council of Nurses (ICN), desde o início da pandemia. Os enfermeiros são os profissionais que am mais tempo com os doentes, muitas vezes horas, para realizar todos os procedimentos necessários, e isso envolve um risco muito grande de contrair a doença.
A enfermeira brasileira Viviane Dornelas trabalha na UTI do Stamford Hospital, em Connecticut, e se contaminou com o coronavírus. Ao AcheiUSA ela disse que mesmo tomando todas as precauções e usando todos os equipamentos de segurança foi contaminada. “Eu chego em casa, troco de roupa na garagem, desinfeto tudo, até as chaves e o celular. Não trago nada de dentro do carro, entro e vou direto para o chuveiro e mesmo assim fui contaminada. No dia 19 de abril eu estava com dor de garganta, no dia seguinte acordei com dor no corpo e me isolei no quarto. Fiz o teste e deu positivo. Meu filho de 17 meses também teve e meu marido não. Já estamos recuperados”.
Todos deveriam ar um dia na UTI para entender a gravidade da doença. Temos que deixar claro que a batalha não terminou”
— Natasha Florencio
Viviane trabalha na UTI do hospital com pacientes que desenvolveram problemas renais por causa do coronavírus. “Foi uma surpresa, porque a Covid-19 atacou muito os rins dos doentes. Pessoas com os rins saudáveis entraram em choque e precisaram começar um processo de hemodiálise, enquanto entubados, na UTI. Muitos precisaram de hemodiálise contínua na UTI”, conta a enfermeira.
Para ela, uma das grandes dificuldades em tempos de coronavírus é o uso constante dos equipamentos de proteção individual, o EPI. “Você não sabe o que é usar uma máscara N-95 por horas, dá dor de cabeça de respirar seu próprio ar, e no topo de tudo isso, tem que usar o escudo (shield) transparente”. Ela completa: “No começo eu tinha muito medo, estávamos reutilizando muita coisa. Agora temos que usar a mesma máscara por três dias, temos sacos de papel para colocar. É tudo bem assustador, mas agora posso dizer que está melhorando um pouco”.
Experiência única
A enfermeira da UTI do hospital Broward Health North, em Deerfield Beach (FL), Natasha Florencio, concorda com Viviane e diz que é muito difícil ficar com os equipamentos de proteção por muitas horas seguidas.
Natasha diz que muitas vezes a um longo período sem tomar água ou ir ao banheiro para não ter que tirar e colocar novamente todo o equipamento. Ela não se contaminou com a doença, mas conhece muitos profissionais que contraíram a Covid-19. “É um processo longo de chegar ao hospital, colocar a roupa e todo o equipamento de proteção. As horas trabalhadas se tornaram mais longas e cansativas. Várias vezes segurávamos para tomar água e ir ao banheiro para não ter que tirar toda aquela roupa. O número de pessoas que se contaminou na troca de equipamentos foi bem alto, é uma hora bem perigosa”, disse a enfermeira.
Natasha – que agora está no Brasil cuidando de familiares que estão com a Covid-19 – relata que chegava para o plantão às 7 da manhã e muitas vezes fazia a primeira refeição à 1pm. O turno era de 12 horas e ela chegou a fazer três dias de plantão seguidos. “A Covid-19 é uma doença nova, desconhecida e que tem um processo de infecção diferente de tudo que já vimos antes. Acumulamos muitas funções já que o número de pessoas para entrar em quarto de isolamento é limitado. Então, o enfermeiro ficou muito sobrecarregado e isso tornou um trabalho, que já era pesado, dez vezes mais exaustivo e estressante porque outros funcionários estão proibidos de entrar nos quartos”, disse.
Sobre a experiência de trabalhar com o coronavírus, Viviane e Natasha afirmam que todo o aprendizado, as horas trabalhadas, a angústia, tristeza e a alegria pela recuperação de pacientes graves serão levados para a vida toda. “É uma experiência da qual eu nunca vou me esquecer e vou levar para o resto da minha vida. Já ei alguns furacões lá dentro do hospital, momentos de aflição e angústia, mas o que amos e ainda estamos ando com o coronavírus é diferente de tudo. Foi algo bem maior, mais complicado e difícil”.
A profissional de saúde lembra que a batalha não terminou e que as pessoas não podem flexibilizar as regras de higiene e distanciamento social até que uma vacina seja encontrada. “Eu costumo dizer que todos deveriam ar um dia na UTI para entender a gravidade da doença. Temos que deixar claro que a batalha não terminou. Vim aqui [para o Brasil] ajudar meus familiares que se contaminaram, vim ajudar minha família, mas deixo claro que minhas colegas de trabalho continuam na luta”.
Natasha retorna para o Sul da Flórida na semana que vem, já que seus familiares se recuperaram. Viviane segue seu trabalho na UTI em Connecticut. “O número de pacientes com a Covid-19 é menor, mas ainda temos muitos que ainda não se recuperaram. É uma luta constante e que levaremos conosco para sempre”.